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Patrícia Oliveira

O julgamento de Agnodice por ter "seduzido suas pacientes", que provocou uma rebelião de mulheres.

Atualizado: 27 de dez. de 2018

Litogravura de Villain - Séc. XIX em: http://www.biusante.parisdescartes.fr/histoire/images/?gabarit=iframe&do=informations-iconographiques&refphot=anmpx09x0017

Redação BBC News Mundo

https://www.bbc.com/mundo/noticias-46637872


Traduzimos o artigo da BBC em espanhol para compartilhar com os leitores do blog essa história tão interessante.


Estava entre a cruz espada. Tinha que demonstrar-lhes que estavam equivocados, revelando-lhes a verdade... embora, ao fazê-lo, significava a morte.

Era o século IV a.C. e Agnodice estava no banco dos réus. Um grupo de médicos tinha apresentado denúncia argumentando que seduzia as mulheres que eram suas pacientes e, pior, que até havia violado a duas, as penetrando.

O veredito do Conselho do Areópago[i] havia sido "culpado".

Não lhe restava mais nenhuma alternativa. Agnodice levantou a túnica e, sem necessidade de palavras, deixou que soubessem que era mulher, não homem, como os tinham feito acreditar.

Sabia que a revelação seria considerada como um delito pior que ter seduzido ou até violado uma de suas pacientes.

"Uma mulher praticando medicina!", exclamaram alguns, medindo as palavras.

Ela tinha dado a razão perfeita para executá-la.

O crime

Essa era a mesma razão pela qual suas pacientes a preferiam.

Era um segredo guardado por ela e por aquelas a quem ela tinha ajudado, pois nessa época estava proibido que mulheres praticassem a medicina.

Nem sempre tinha sido assim.

Não muito antes de que Agnodice decidira dedicar-se a ser parteira, a prática era considerada como una profissão honorável na civilização grega.

Una das célebres parteiras era Fanáreta, a mãe do filósofo Sócrates (470-399 a.C.).

E, embora o contemporâneo mais famoso de Sócrates, Hipócrates (460-380 a.C.), o pai da Medicina moderna, não admitia mulheres em sua primeira escola de medicina, na sua ilha natal de Cós, parece que as permitia estudar temas obstétricos y ginecológicos em suas outras instalações de ensino.

Entretanto, os atenienses poderosos não viam com bons olhos que as matronas acumulassem tão impressionante gama de conhecimentos e talentos num campo relacionado com a reprodução de seus herdeiros.

Assim sendo, decidiram proibir que mulheres praticassem a obstetrícia e a medicina, sob pena de morte.

Foi um golpe terrível, não só para as parteiras que ficaram sem meios de subsistência, senão também para as mulheres cujos partos, sem a ajuda de uma parteira, constantemente terminavam em desastre.

Timidez

A Grécia antiga era uma sociedade que valorizava muito a modéstia feminina, e isso fez com que a transição das parteiras aos médicos não fosse fácil.

Apesar dos avanços da medicina introduzidos por Hipócrates e da vontade dos homens recém treinados para cuidar das mulheres, elas se negaram rotundamente a permitir que os médicos as examinassem ou ajudassem no momento de dar a luz.

Do ponto de vista dos médicos, as mulheres eram criaturas obstinadas, sem interesse no seu próprio tratamento ou saúde e responsáveis pelo número cada vez maior de mortes relacionadas com o parto.

Entretanto, o que demostrou a ousadia de Agnodice foi que, todo esse sofrimento poderia ter sido evitado se não tivessem proibido o trabalho das parteiras.

Ela

Agnodice queria estudar Medicina e praticar obstetrícia desde pequenina. Quando as portas se fecharam para as mulheres, cortou o cabelo, pôs roupa de homem e foi de Atenas a Alexandria para estudar com um dos seguidores de Hipócrates.

Foi nada menos que o primeiro anatomista, Herófilo de Calcedonia (335-280 a.C.), cofundador da lendária Escola de Medicina de Alexandria, que compartilhou sua sabedoria médica sem saber que era mulher.

Após seu regresso a Atenas, já graduada, Agnodice atendeu um parto particularmente difícil.

A mulher se negava a deixar-se ver pelos médicos apesar de sua agonia. Desesperada para ajudar, Agnodice levantou sua túnica para revelar seus seios; ao vê-los, a paciente, aliviada, permitiu que ajudasse.

O segredo de Agnodice se espalhou rapidamente entre as mulheres e seu trabalho cresceu tanto que os outros médicos se ressentiram.

Por isso começaram a fazer correr o rumor de que seduzia e corrompia as esposas de outros homens, e levantaram falsos testemunhos para acusa-la de violação sexual com penetração das pacientes.

Voltando ao julgamento

Era indubitável que Agnodice havia violado a lei, e os que estavam presentes no julgamento sabiam qual era o castigo.

Porém um grande obstáculo os impediu: uma multidão furiosa de mulheres atenienses abastadas, que Agnodice tinha ajudado, entre elas esposas de médicos e políticos que a haviam acusado, exigiram sua libertação.

Sem ela, afirmaram, muitas delas estariam mortas ou morreriam no futuro.

Se executassem Agnodice, declararam, "todas morreremos com ela".

A rebelião resultou não só na libertação de Agnodice como também na anulação da lei que proibia as mulheres de praticar a medicina, sempre e quando só trataram pacientes do mesmo gênero.

..........................

Antes de terminarmos, é importante destacar que esta é uma das várias histórias que sempre foi, e provavelmente sempre será, um mistério histórico.

Alguns eruditos creem firmemente que é um fato histórico, enquanto que outros creem que pertence ao reino dos mitos e das lendas.

Provavelmente nunca saberemos qual é a verdade.

[i] Areópago (grego antigo: Ἄρειος Πάγος areios pagos, "Colina de Ares") supremo tribunal ateniense.



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